Deus Destrói?*

Respostas à alegação que o pecado se autodestrói sem a intervenção de Deus.

March 20, 1985

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Escrito por Frank B. Holbrook

Respostas à alegação que o pecado se autodestrói sem a intervenção de Deus.

A. Como vejo, o problema crucial do autor é que ele descobriu um método que Deus usa no tempo
probatório para disciplinar e punir o pecado. Este mecanismo ele aplica a todas as formas de punição
judicial divina incluindo o julgamento final executivo e punição devido o pecado de acordo com
a experiência humana. Aqui, na minha opinião, está um aspecto de seu ponto de vista que está errado,
porque ele o obriga a torcer alguns dados das Escrituras para torna-los convenientes.

Em segundo lugar, parece-me que ele ignorou aquelas passagens na Escritura e no Espírito de
Profecia que lidam com os conceitos da justiça de Deus e a responsabilidade humana. É verdade que em
um sentido o pecado se autodestrói, mas também é verdade que o amor de Deus é um amor santo; a
justiça é um outro lado da moeda. O amor verdadeiro e a justiça são unidos. E a justiça requer punição
adequada da transgressão e não deve ser posta de lado pela verdade válida que o pecado se autodestrói. O
homem ímpio pode morrer por usar drogas, ou um corpo abusado pode ser quebrantado, ou ter um
confronto com a lei. E podemos afirmar que o homem destrói a si mesmo. Mas ele ainda enfrenta um
julgamento no tribunal de Deus. Ele deve prestar contas (Rm 14:10-12; At 24:25). E ele será punido de
acordo com os seus atos (2 Co 5:10). “Deus retribuirá a cada um conforme o seu procedimento” (Rm 2:6
NVI). Isto terá sido um ato de Deus. Isso não pode de forma alguma ser simplesmente ou apenas o
mecanismo da retirada da Sua bênção e proteção visto que o julgamento executivo acontece depois do
tempo probatório humano e aqueles que permanecem sob condenação são tanto os anjos caídos bem
como a humanidade impenitente.

B. Em quais sentidos legítimos pode ser afirmado que Deus não destrói?
Primeiro, pode ser afirmado que Deus não destrói o pecador no sentido que Ele não faz
arbitrariamente que alguém se perca. Cada pessoa, usando seu livre-arbítrio, escolhe por si mesma se
servirá e amará a Deus ou desobedecerá e estará eternamente perdida. É neste sentido que Ellen White
diz: “Deus não destrói a ninguém. Todo aquele que for destruído ter-se-á destruído a si mesmo. Todo
aquele que sufoca as admoestações da consciência está lançando as sementes da incredulidade, e estas
produzirão uma colheita certa.” (Parábolas de Jesus, pp. 84, 85).

Segundo, pode ser afirmado que Deus não destrói o pecador no sentido das consequências que
resultam de um estilo de vida pecaminoso. Este é o princípio expresso em Gálatas 6:7 – nós colhemos
aquilo que semeamos. Isto é refletido no segundo mandamento no qual é dito que Deus visita “a
iniquidade dos pais sobre os filhos até a terceira e quarta geração” (Êx 20:5). Aqui pensamos na lei da
hereditariedade que Deus estabeleceu. Violações da lei física e moral trazem julgamentos e
consequências. Não podemos pecar com impunidade. Este é o sentido da declaração de Ellen White
quando ela afirma: “O pecador mesmo acarreta sobre si a punição. Suas próprias ações dão princípio a
uma cadeia de circunstâncias que trazem o resultado seguro.” (Mensagens Escolhidas, Livro 1, p. 235).
Terceiro, pode ser argumentado que Deus não destrói o pecador no sentido que quando Seu povo O
rejeita e O repele, Ele retira Sua bênção e proteção, e os pecadores são deixados para ser fantoches de
Satanás ou sujeitos a forças destrutivas dos seus inimigos. O rei Saul é um exemplo a nível pessoal de
alguém que Satanás tomou posse. Israel e Judá são exemplos de casos em que Deus retirou Suas bênçãos
e proteção e permitiu que essas nações fossem invadidas por seus inimigos.
Estes segundo e terceiro sentidos estão corretos e são o que o autor usou para desenvolver o que ele
chama de mecanismo através do qual Deus destrói: retirada da proteção e bênção. Ele cita como “um
capítulo chave” sobre isto “A Destruição de Jerusalém” no livro O Grande Conflito. Ele cita parte do que
segue, mas eu darei todo o contexto:
2
Não podemos saber quanto devemos a Cristo pela paz e proteção de que gozamos. É o poder
de Deus que impede que a humanidade passe completamente para o domínio de Satanás. Os
desobedientes e ingratos têm grande motivo de gratidão pela misericórdia e longanimidade de
Deus, que contém o cruel e pernicioso poder do maligno. Quando, porém, os homens passam os
limites da clemência divina, a restrição é removida. Deus não fica em relação ao pecador como
executor da sentença contra a transgressão; mas deixa entregues a si mesmos os que rejeitam Sua
misericórdia, para colherem aquilo que semearam. Cada raio de luz rejeitado, cada advertência
desprezada ou desatendida, cada paixão contemporizada, cada transgressão da lei de Deus, é uma
semente lançada, a qual produz infalível colheita. O Espírito de Deus, persistentemente resistido,
é afinal retirado do pecador, e então poder algum permanece para dominar as más paixões da
alma, e nenhuma proteção contra a maldade e inimizade de Satanás. A destruição de Jerusalém
constitui tremendo e solene advertência a todos os que estão tratando levianamente com os
oferecimentos da graça divina e resistindo aos rogos da misericórdia de Deus. Jamais foi dado um
testemunho mais decisivo do ódio ao pecado por parte de Deus, e do castigo certo que recairá
sobre o culpado. (O Grande Conflito, 36).

Concordamos que a Bíblia apresenta esta espécie de mecanismo (retirada da bênção e proteção) como
um dos métodos de Deus de efetuar julgamento. Mas deveria ser observado que este mecanismo ocorre
durante o tempo probatório quando Satanás está ativo. Este mecanismo obviamente não poderá
funcionar depois que o reinado de Satanás estiver terminado.

C. Outros exemplos citados como evidência do mecanismo retirada da proteção/ bênção:
1. Jó. Aqui novamente estamos lidando com o tempo probatório. A questão é o grande conflito entre
Deus e Satanás e é realmente apenas tangencial à questão da punição divina. Permitindo que Satanás
exista e desenvolva seus princípios, é necessário para que Deus permita, dentro de limites, as operações
de Satanás tanto sobre os bons como sobre os maus. O alegado critério que o “fogo de Deus” caiu sobre
as ovelhas de Jó (Jó 1:16) são as palavras do servo, não de Deus ou da inspiração. Isto teria sido causado
por Satanás, mas aqui novamente estamos no tempo probatório quando Satanás está ativo.
2. A Lei de Deus. Embora a lei de Deus proíba matar é evidente dos dados bíblicos que esta é uma
lei moral que proíbe o assassinato. Ela não se aplica a execuções judiciais ou à justiça executiva final.
Somente Deus é a fonte de vida; como Criador Ele pode conceder vida diretamente, ou Ele pode
diretamente remove-la na execução judicial. Não devemos fazer mau uso da lei de Deus e reverte-la
contra o seu Autor. Como o apóstolo diz: “Deus é injusto por aplicar a sua ira? (Estou usando um
argumento humano.) Claro que não! Se fosse assim, como Deus iria julgar o mundo?” (1 Rm 3:5-6 NVI).

3. O testemunho de Jesus.
a. A destruição das obras de Satanás revelando a verdade a respeito de Deus é simplesmente uma
maneira figurativa de falar. A revelação verdadeira não destrói nada. Mas ela faz com que a destruição
final seja possível com o consentimento do universo inteligente. É a revelação do caráter e obras de Deus
em contraste com as obras e caráter de Satanás e os frutos dos Seus princípios que levam as inteligências
do universo a concordarem com o julgamento do pecado realizado por Deus.
b. A morte de Jesus como uma ilustração do mecanismo que Deus usa para destruir o pecado (retirada
da bênção e proteção).

Eu creio que existe outro engano cometido pelo autor: Igualar a morte vicária de Cristo pelos
pecadores com a morte por execução de um pecador. Existem algumas similaridades, mas realmente não
uma correspondência uma-a-uma em todos os pontos. A morte de Cristo foi voluntária; Ele renunciou à
Sua vida por escolha (Jo 10:18). É verdade que Ele sofreu o julgamento da Divindade pelo pecado. Deus
retirou a sensação de Sua presença. De alguma maneira misteriosa o pecado de toda a humanidade foi
colocado sobre Ele, imputado a Ele (Is 53:6; 1 Pe 2:24). Sua morte foi vicária ou substitutiva em natureza
(“Pois também Cristo sofreu pelos pecados uma vez por todas, o justo pelos injustos” 1 Peter 3:18 NVI).
Ele mesmo era sem pecado (2 Co 5:21). Ele estava em perfeita união com Seu Pai. Conhecendo Seu Pai
3 tão intimamente, Ele temeu que a separação seria eterna. A angústia mental da rejeição divina foi tão
pavorosa (porque Ele conhecia o Pai muito bem) despedaçou Seu coração.

Mas o pecador impenitente não estará em tal posição depois do término do tempo da graça. Mais
propriamente, ele extinguiu o apelo do Espírito; ele endureceu seu coração contra o seu Criador. Ele será
punido de acordo com os seus atos e então será privado de sua vida. Os sofrimentos de Cristo teriam sido
os mesmos por apenas um pecador como foi por toda a raça. A destruição do pecador envolverá a total
aniquilação da pessoa (Mt 10:28), e nenhuma ressurreição se seguirá. Mas o corpo de Cristo não foi
destruído, e Ele ressurgiu novamente.

Dados Bíblico Sobre Uma Ação Direta do Criador (Execução Judicial)
Embora a destruição do ímpio seja apresentada como a “obra muito estranha” (Is 28:21 NVI) de
Deus, a verdadeira justiça exige punição e execução apropriadas. Depois do tempo probatório, não existe
evidência que um mecanismo de retirada de bênção e proteção funcione. Os anjos não vêm injustiça ou
macula no caráter de Deus em Sua punição direta do ímpio. As sete últimas pragas (nelas “se completa a
ira de Deus” Ap 15:1 NVI) devem ser derramadas pela ação direta de Deus. O pecado não é um
mecanismo para produzi-las; Satanás não pode produzi-las (Deus e Satanás não são parceiros). Estas são
julgamentos que Deus produz por qualquer operação de Suas leis que Ele escolha. Na terceira praga (rios
e fontes se transformam em sangue) o anjo diz: “Tu és justo, tu, o Santo, que és e que eras, porque tu
julgaste estas coisas; pois eles derramaram o sangue dos teus santos e dos teus profetas, e tu lhes deste
sangue para beber, como eles merecem.” E outra voz celestial responde: “Sim, Senhor Deus todopoderoso, verdadeiros e justos são os teus juízos” (Ap 16:5-7 NVI).

A justiça executiva punirá o impenitente de acordo com os seus atos. Este julgamento punitivo tinha
que ter sido imposto, e não poderia vir simplesmente como um resultado natural do pecado, nem como
uma simples retirada da proteção divina. Ellen White escreve:
Então (os santos) designaram aos ímpios a parte que deverão sofrer, segundo suas obras; e
isto foi escrito defronte de seus nomes no livro da morte. Satanás também, e seus anjos, foram
julgados por Jesus e os santos. O castigo de Satanás deveria ser muito maior do que o daqueles a
quem ele enganara. Seu sofrimento excederia ao deles a ponto de não haver comparação. Depois
que todos aqueles a quem ele enganara houverem perecido, Satanás deverá ainda viver e sofrer
muito mais tempo. (Primeiros Escritos, p. 291, ênfase adicionada; cf. O Grande Conflito, p. 661.)
Satanás precipita-se para o meio de seus seguidores, e procura instigar a multidão à atividade. Mas
fogo de Deus, procedente do Céu, derrame-se sobre eles e os grandes homens, os homens poderosos, os
nobres, e os pobres e miseráveis, todos são juntamente consumidos. Vi que alguns foram destruídos
rapidamente, enquanto outros sofreram mais tempo. Foram castigados segundo as ações feitas no
corpo. Alguns ficaram muitos dias a consumir-se e, precisamente enquanto houvesse uma parte deles a
ser consumida, permaneceu toda a sensação do sofrimento. Disse o anjo: “O verme da vida não morrerá;
seu fogo não se apagará enquanto houver a mínima particular para ele devorar.”
Satanás e seus anjos sofreram muito tempo. Satanás não somente arrostou o peso e castigo de seus
próprios pecados, mas também dos pecados da hoste dos remidos, os quais foram colocados sobre ele; e
também deve sofrer pela ruína de almas, por ele causada. Vi então que Satanás e toda hoste ímpia foram
consumidos, e foi satisfeita a justiça de Deus; e todo o exército dos anjos e os santos remidos todos, com
grande voz, disseram: “Amém.” (Primeiros Escritos, pp. 294-95, ênfase adicionada.)

Esta é punição judicial. Isto é uma questão de justiça. Ela terá sido um ato direto do Juiz de toda a
terra. Satanás e suas hostes não podem ser considerados como uma parte do mecanismo visto que eles
também são objetos desta punição. Ela é mais do que uma retirada da misericórdia e proteção ou até
mesmo da própria vida visto que nesse caso o pecador morreria instantaneamente. Mas os dados bíblicos
e as afirmações de Ellen White indicam que o impenitente será punido de acordo com os seus
atos antes de ser privado da vida. Isto é simples justiça que Deus o justo Juiz não deve apenas impor, mas
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deve executar. Não fará sentido simplesmente dizer que Ele retirará a operação desta ou daquela lei.
Qualquer que seja o mecanismo que Deus empregará para realizar esta destruição, Ele terá que ser o
Único a emprega-lo. Os métodos que Deus emprega para disciplinar o Seu povo durante o tempo
probatório na realidade não podem ser impostos sobre Seu método de executar a justiça executiva final.
Num ponto de vista alongado, entretanto, não é de fato um método específico que deveria nos
preocupar, mas os resultados. Quando o plano estiver terminado, e a misericórdia e justiça de Deus
tiverem sido demonstradas, toda a criação inteligente dirá: “Grandes e maravilhosas são as Tuas obras,
Senhor Deus Todo-Poderoso; justos e verdadeiros são os Teus caminhos, Tu és Rei dos santos.”
Uma coisa mais deve ser dita. Compreende-se das Escrituras que Deus realizou alguns atos de justiça
executiva durante o tempo probatório como admoestações ao ímpio.

1. O Dilúvio. Esta foi uma intervenção direta de Deus. Embora Seu Espírito tenha sido retirado por
causa da resistência dos antediluvianos, sua destruição física não aconteceu por causa da retirada de Sua
proteção e bênção ou por causa de ações de Satanás ou invasões de inimigos como aconteceu a Judá e
Jerusalém. O autor especula que o próprio Deus retirou Sua proteção e bênção e consequentemente o Sol
e a Lua sofreram mudanças drásticas (porque Ele não estava mantendo ativamente as leis da natureza) e
desse modo a grande massa de água do firmamento caiu. Visto que “o poder controlador, o poder
sustentador dos elementos não estava mais presente … uma grande elevação da superfície da Terra
ocorreu” (p. 14).

Isto é simplesmente um jogo de palavras e indica os extremos a que alguém chega a fim de estender
alguns dos métodos de disciplina de Deus no tempo probatório para a área da justiça executiva no fim do
mundo. Aqui o autor é forçado a admitir que Deus executa a destruição do ímpio diretamente. Se Deus
tivesse abandonado o controle das forças desta terra, até mesmo Noé e sua família teriam perecido. Mas
Deus estava no controle. Realmente não sabemos como Deus fez com que o Dilúvio acontecesse, mas Ele
o fêz acontecer. O argumento do autor é como afirmar que o executor que pressiona o botão não executa o
criminoso na cadeira elétrica! Existe uma falha aqui em compreender o lugar apropriado da justiça diante
do amor santo. A justiça executiva do Juiz divino não é incompatível com o Seu amor.

O ponto ao qual desejo chegar é que o Dilúvio é tomado como um exemplo da execução judicial de
Deus sobre o impenitente que prediz a execução final do impenitente pelo fogo no fim do mundo (2 Pe
3:5-7).

2. Sodoma e Gomorra (Gn 19:24). Aqui novamente a ruína dessas duas cidades e de seus habitantes
não é por um mecanismo de retirada de Deus, nem foi por Satanás ou seus inimigos. Este é um exemplo
de destruição direta que é vista pelos escritores da Bíblia como uma advertência da destruição final do
impenitente (Jd 7; 2 Pe 2:6). Não é importante especular quais leis Deus permitiu operar ou deixar de
operar para produzir o fogo e enxofre que destruiu estes pecadores rebeldes.

3. Finalmente, há exemplos de julgamentos diretos de Deus em casos individuais: Nadabe e Abiú (Lv
10:1-2). Uzá – “Então a ira do Senhor se ascendeu contra Uzá, e Deus o feriu ali por esta imprudência; e
morreu ali junto à arca de Deus” (2 Sm 6:7 JFA). Ananias e Safira (At 5:1-10). Elimas (At 13:8-11).
O ponto ao qual o autor chega, assim me parece, é a uma preponderância sobre um pormenor que ele
sente ser necessário manter a fim de justificar o caráter de Deus. A justiça executiva de Deus depois do
encerramento do tempo de graça lhe parece desfigurar Seu caráter, então ele tentou impor um dos
métodos de Deus lidar com a justiça durante o tempo probatório sobre Seus atos finais da justiça
executiva. É desastroso que o autor exagere o mecanismo de punição além de toda proporção. Mas o
ponto de vista realmente não se encaixa na informação providenciada pela Bíblia e pelo Espírito de
Profecia e resulta numa distorção da justiça divina e finalmente retrata uma distorção do caráter de Deus.

*Extrato de uma crítica a um sermão impresso pelo Dr. Elliot Douglin.